Sobre se despedir de casa
Depois de meses vivendo essa impermanência, finalmente me mudei de São Paulo
É tempo de partir, mas a iminência dessa partida é calada. (…) nunca partimos aos poucos, não nos preparamos, fazemos como se nada nunca fosse mudar até que tudo se altera de uma só vez. - Nastassja Martin, Escute as feras
Escrevo essa edição ainda de São Paulo, mas enquanto você a lê, já estou no Canadá, começando a construir a minha nova vida. Apesar de ser mais uma grande mudança, não é a primeira — e é bem diferente daquela que vivi em 2015, quando cheguei na capital paulista.
Me mudar para São Paulo foi a melhor coisa que eu fiz na vida. Foi aqui que eu aprendi a viver sozinha. A lidar com minha solidão, primeiro de um jeito meio cabeçudo (tentando evitá-la a qualquer custo), depois com acolhimento e maturidade (e Novos Baianos nas manhã de sábado). Foi aqui que minha filha nasceu. Conheci meu marido, um exímio paulistano da zona sul, em um bar da Vila Madalena. Foi onde cresci profissionalmente, onde parei de cobrar R$ 500 por cinco posts por semana. Foi onde me inspirei e escrevi um livro sobre amores que vivi. Foi onde comecei a tomar bons cafés e sim, isso é importante. Que tomei meu primeiro porre na vida. Que virei mulher, porque quando cheguei, era apenas uma menina.
Foi onde me tornei quem sou.
Mudar do interior pra cá me fez construir uma família longe de casa e um lar em diferentes endereços. Me ensinou que sou mais forte do que imaginava e que quando você deseja algo com todo seu coração, o universo conspira a seu favor. Eu sei, parece coisa de autoajuda tilelê, mas foi assim que rolou comigo: quando eu decidi que me mudaria para lá, tudo conspirou para que acontesse. Eu tinha R$ 900 reais na conta, um emprego CLT já confirmado e um sonho. Deu tudo certo.
Agora, mudo para outro país com uma família que construí em São Paulo. Não existe aquele deslumbramento, apesar de ter uma excitação tal qual 2015. Mas maior que tudo isso, é a felicidade imensa em saber que meu lar independe de um endereço físico.
Depois de uma odisseia de muitos meses, de viver como nômade por mais outros tantos, eu finalmente escrevo esse texto da minha casa1 em Vancouver!2 UFA! Eu nunca tive a pretensão de ser nômade digital, esse lifestyle nunca me pareceu sedutor porque eu odeio fazer malas, amo ter um banheiro cheio de cosméticos e produtos que eu vejo perder a validade sem usar, uma gaveta com diferentes tipos de papéis e sou maluca por ter impressora em casa. Sendo assim, sempre achei essa parada de nômade digital uma coisa legal mas não pra mim, então, imagine só viver isso com uma bebê de 1 ano. Foi o caos. Mas passou. Finalmente estamos em casa.
Uma amiga me disse que o período de adaptação em um novo país é uma vivência em um não-lugar. “Você não está mais no Brasil, mas também não está no Canadá”, me avisou. Em apenas duas semanas e pouco, sinto mais ou menos isso por continuar trabalhando no horário do Brasil. Estou cinco horas atrás, de volta ao passado. Aqui, quando acordo às 5h da manhã, o Brasil já está trabalhando há duas horas. Estou atrasada mesmo acordando de madrugada. É claro que essa dinâmica está me deixando ansiosa, me fazendo sentir que sou uma péssima profissional (mesmo entregando estratégias lindas e impecáveis) e etc, mas é o que tem pra hoje e sou muito grata pela possibilidade de poder trabalhar remotamente.
Maria, provando que crianças são infinitamente superiores aos adultos, está 100% adaptada. Não reclama de frio, ajustou seu fuso horário e seus cochilos em um só dia e já está começando na escolinha. Todos falam sobre o quanto ela é sociável e amigável. É muito claro para quem ela puxou e que não foi pra mim.
Enfim. A vida segue se ajustando. Muita coisa já foi feita. Muitas outras ainda precisam ser. Imigrar é difícil, mas é menos complicado quando você faz com as pessoas que você mais ama no mundo. Casa é onde fica o coração. <3
Eu estou…
Lendo: Depois de ter terminado Memórias Póstumas de Brás Cubas (sim, li agora, aos 31 anos, e foi incrível), comecei o O perigo de estar lúcida, da Rosa Montero. Nesse livro, Rosa mostra a ligação entre criatividade e instabilidade mental e embasa toda uma teoria de que escritores têm mais tendências a doenças mentais como depressão, ansiedade e adjacentes. Ela reúne relatos de grandes nomes da literatura (Virgina Woolf, Sylvia Plath, Fiztegerald etc) com diversos estudos científicos para provar sua tese. É impressionante o quanto eu consigo me ver nas hipóteses e nos exemplos dados. Basicamente, eu só escrevo porque sou desgraçada da cabeça e isso fez mais sentido o que eu gostaria.
Vendo: Me lembrei de que tinha começado a ver Daisy Jones and The Six e voltei ontem. Ainda continuo achando o livro infinitamente melhor que a série, mas é um bom passatempo (apesar de ser agoniante o quão feio deixaram o Sam Claffin). Vi o hypado Saltburn e apesar de ser melhor que a bomba que é Promising Young Woman, é igualmente ruim e pretensioso. Se querem ver filme de bicha problemática, trambiqueira e psicopata, vejam O Talentoso Ripley, que além de oferecer um roteiro infinitamente melhor e mais consistente, tem isso aqui, ó:
Pelo menos, pelos próximos três meses. Estamos já em busca de uma casinha real/oficial para chamar de nossa e para nossa pequena ter um quarto dos sonhos.
Na verdade, estamos morando em Tsawwassen, que é uma província (?) de Delta, uma cidadezinha do lado de Vancouver. Acho isso tudo muito difícil de explicar, então, digo que estou em Vancouver, que é 15 minutos da minha casa. Enfim, eu sou oficialmente uma suburban mom. <3
a forma como percebemos lar é muito diferente das décadas passadas, né? encontrar o lar em algumas pessoas nem tanto, mas todo sentimento de pertencimento e gratidão a locais que nos fizeram ser quem somos, mas não necessariamente sentimos a obrigação de habitá-los para sempre. somos seres que estão mudando diariamente e às vezes o que procuramos para o futuro não é o que imaginávamos anos atrás, inclusive, onde chamamos de lar.
estou em um processo parecido, mas muito mais cru que o seu. o mais importante é abraçar as mudanças e todo processo que vem com elas. feliz que minha amiga é uma suburban mom e mal posso esperar para acompanhar as próximas aventuras. felicidade na nova fase de vocês. <3