Eu tenho a constante sensação de que todas as pessoas estão fazendo mais. Que estão vivendo mais, trabalhando mais, produzindo mais. Ler coisas como “ficar parado também é movimento” age como aquela tomada de fôlego que te garantem 3 segundos de oxigênio para você continuar nadando até o final da raia. Não serve pra muita coisa, no final das contas. Essa analogia também me lembra de que eu deveria fazer exercícios, me cuidar mais, ler mais.
Mais.
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Tenho uma infinita lista de coisas que eu quero aprender a fazer sem exigir nenhuma performance. Comprei uma caixinha de tintas acrílicas da Stadler e uma tela quadradinha na dollar store. Estou ensaiando comprar uns pincéis na Staples para, quem sabe, finalmente, pintar alguma coisa despretensiosamente. Umas flores, como as que eu fazia nas aulas de educação artística da escola? Um lettering como os que eu fazia nos meus diários antes mesmo disso ter nome? Enquanto tento decidir, os dias passam.
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Também quero aprender a ler tarô, como falei em algumas edições passadas. Vi hoje o texto da
falando sobre esse seu processo e, em vez de pensar "que bonita a forma com que ela o interpreta, mesmo sem fazê-lo", eu só consegui pensar “eu preciso começar logo". De repente, todas as pessoas me parecem concorrentes em uma corrida imaginária para sabe-se lá onde._
Tentando tirar pelo menos algumas das mais tangíveis de minhas pendências, voltei a ler o "The Age of Magical Overthinking” e no capítulo "The Shit-Talking Hypothesis", a autora Amanda Montell fala algo que eu grifei e coloquei várias exclamações do lado: a internet a fez enxergar a vida mais ou menos como se existisse uma quantidade limitada de luz no universo — se uma pessoa brilhava, isso significava que menos iluminada ela estava.
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Em suas palavras livremente traduzidas por mim,
“Me comparar com outras mulheres na internet era um padrão que já estava internalizado no meu sistema, mas agora não era só sobre looks, mas sobre minha carreira, minha inteligência, minha alma."
De repente, comecei a ver todas as pessoas andando, correndo, voando. E eu parada, enterrada até o pescoço por uma pilha de possíveis caminhos que eu era incapaz de seguir.
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Me vem novamente à cabeça o conto da figueira, da Sylvia Plath.
“Eu via minha vida se ramificando à minha frente como a figueira verde daquele conto. Da ponta de cada galho, como um enorme figo púrpura, um futuro maravilhoso acenava e cintilava. Um desses figos era um lar feliz com marido e filhos, outro era uma poeta famosa, outro, uma professora brilhante, outro era Ê Gê, a fantástica editora, outro era feito de viagens à Europa, África e América do Sul, outro era Constantin e Sócrates e Átila e um monte de amantes com nomes estranhos e profissões excêntricas, outro era uma campeã olímpica de remo, e acima desses figos havia muitos outros que eu não conseguia enxergar. Me vi sentada embaixo da árvore, morrendo de fome, simplesmente porque não conseguia decidir com qual figo eu ficaria. Eu queria todos eles, mas escolher um significava perder todo o resto, e enquanto eu ficava ali sentada, incapaz de tomar uma decisão, os figos começaram a encolher e ficar pretos e, um por um, desabaram no chão aos meus pés. […]”
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Mês que vem completam 8 meses que cheguei no Canadá. Comecei as aulas da faculdade tem três semanas. Ainda não tenho nenhum amigo aqui. É difícil, solitário, me faz sentir incrivelmente estranha. Meus amigos no Brasil estão vivendo suas próprias vidas em seus próprios fusos. Eu sempre fui péssima para manter amizades à distância, ainda que o amor seja proporcional aos quilômetros de separação.
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A maternidade não pode mais ser usada como desculpas para a minha inércia. Maria é perfeita, esperta, independente. As coisas ficam infinitamente mais fáceis a cada dia. Não posso mais dizer que não tenho tempo pra nada. Eu tenho. Mas pra quê? Pra fazer o quê?
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Os freelas remotos parecem ter acabado e, junto com eles, minha possibilidade de trabalho na minha área mesmo em outro país. Pela primeira vez desde os meus 18 anos eu estou sem trabalho há mais de um mês. Me desespero todos os dias antes de dormir. Não consigo tomar nenhuma grande atitude a não ser aplicar para uma vaga ou outra no LinkedIn.
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Vejo uma autora que gosto e que tem a idade próxima da minha publicando mais um livro que, antes mesmo do lançamento, já é um sucesso estrondoso de vendas. Me ressinto, mesmo sem conseguir passar das 50 páginas do meu estimado novo romance. Respiro fundo. Olho pro relógio. Já se passaram três horas.
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Não consegui enviar a nova edição do Trend Seeker. Maria teve febre a noite toda e hoje ficamos com ela em casa. Na minha cabeça, todas as pessoas do mundo notaram que não só não enviei a edição de hoje, como na semana retrasada também falhei. No cenário imaginado criado pela minha constante sensação de fracasso, todas as pessoas estão acompanhando minha performance.
Performance de quê? Pra quê?
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Leio um capítulo do livro As Irmãs Blues. A cena do Charlie escrevendo poesia me faz lembrar de que preciso terminar o meu curso. E que tenho matérias da faculdade já acumuladas. Que tenho que fazer um curso de inglês, já que minha argumentação e fala no idioma é terrível. Me sinto empacada. Entendo tudo, não falo nada.
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Entendo tudo. Não falo nada.
Leio tudo. Não escrevo nada.
Absorvo tudo. Não respondo nada.
Do nada, virei agente passiva da minha própria história.
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Achei que a solução seria voltar a tomar remédio. Falei com meu médico e psicólogo. Ele acredita fazer sentido. Une o uso com a possibilidade também de evitar as crises de enxaqueca que aumentaram muito nos últimos meses. Volto com a Venlafaxina, mas com a metade da dose de outrora.
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Empacada.
Mas já não dói tanto, mais.
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Todo mundo faz mais.
Pelo menos, agora, volto a tentar.
Um pouquinho todos os dias.
Cada dia um pouco mais.
Mais.
Me vi nas suas palavras 💜
Tento pensar que há dias melhores que outros e que aos poucos essa angústia vai diminuindo
Força ♡